sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Psicologia, Pesquisa e Profissão

Este relato irá apresentar algumas discussões sobre a atividade de iniciação científica na graduação de Psicologia, buscando ressaltar a sua importância no que se refere à formação do Psicólogo. Sabemos que a discussão não se encerra por aqui, e que os argumentos apresentados são insuficientes para produzir juízos de fato. É importante ressaltar que este texto representa um convite à reflexão ao invés de uma crítica passível de generalizações. 

Como nos alerta Demo (1988) “não pode haver docência nem discência efetiva sem o fundamento da pesquisa”. Logo, pensamos que a prática de iniciação científica é uma forma de socialização com o ambiente acadêmico e seus instrumentos. Que permite envolver os discentes em uma visão crítica da realidade, favorecendo o trânsito dentro e fora da instituição de ensino e por fim proporcionando o domínio teórico, metodológico, argumentativo, entre outros. 

Tomando como referência o Diretório dos Grupos de Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) no ano de 2010, Minas Gerais representa 10,3 % dos Grupos de Pesquisa registrados segundo a unidade federativa. Formando, ao lado de São Paulo e Rio de Janeiro, um eixo importante para a ciência e tecnologia no País. De 2007 a 2010 podemos perceber que a distribuição dos grupos de pesquisa segundo o ano de formação condiz com os investimentos realizados no setor. Para que se tenha ideia, entre 1999 e 2002 foram registrados 5.045 grupos de pesquisa, sendo que entre 2007 e 2010 este número dobrou, atingindo a marca dos 11.285 grupos registrados (CNPQ, 2010). No que compete à Psicologia, estamos entre os dez primeiros colocados, em uma lista de setenta e seis, na distribuição dos grupos de pesquisa segundo a área do conhecimento predominante nas atividades do grupo (CNPQ, 2010). 

A Fundação Educacional de Divinópolis, criada em 1964, é uma fundação de direito privado, associada à UEMG e mantenedora de sete unidades acadêmicas voltadas para a educação superior e que se destaca no cenário do centro-oeste mineiro por suas propostas de pesquisa, ensino e extensão. Contudo, dentre os dezessete grupos registrados junto ao Centro de Pesquisa (CEPE) da instituição, apenas quatro são coordenados por professores da Psicologia[1]. Algo interessante, que em outro momento merece uma discussão mais adequada, quando equiparado ao crescimento em nível estadual e nacional. 

Em geral, a atividade de pesquisa tem início com a revisão de literatura que compõe o quadro de elementos iniciais para a estruturação básica quanto ao objetivo, perguntas e hipóteses (GÜNTHER, 2003; DEMO, 1988; MINAYO, 2010; dentre outros). Esta ação é essencial para a escolha dos métodos e técnicas que serão utilizados. A revisão literária também contribuiu para balizar as discussões de um grupo e para possibilitar um posicionamento sobre o qual é possível obter um panorama amplo em relação ao que já foi produzido sobre o tema. Por fim, tal atividade auxilia no reconhecimento das possibilidades e limites demarcados pela própria teoria, facilitando a escolha de uma dentre as várias possibilidades que o próprio tema oferece. 

Adotamos a atividade de pesquisa como base de qualquer atividade acadêmica, seja de extensão, ensino e até mesmo no contexto das práticas. Então, pensemos: O Psicólogo no sistema de educação, no sistema de saúde, judiciário, entre outros, não faz/deve fazer pesquisa? O percurso metodológico pode contribuir para a prática em demais setores além do campo da pesquisa? Esta contextualização teórica feita pelo pesquisador pode contribuir para o psicólogo em outros momentos? O que quero dizer, é que ao se socializar com os procedimentos científicos, o profissional adquire maior capacidade de refletir e agir criticamente em relação aos demais contextos, demandas e práticas às quais ele se dispõe a atender. Mais um motivo para refletirmos sobre a nossa formação, ou seja, a maneira com a qual estamos nos instrumentalizando. 

A discussão ora apresentada retoma o uso de um instrumento que não é novo enquanto prática de ensino (DEMO, 1996), mas é extremamente interessante na graduação. As discussões em sala sobre métodos e técnicas, critérios diagnósticos, e outros, possibilitam assimilar o saber instituído, mas às vezes é entendida como uma teoria que se encerra em si mesma. Às vezes se encerra juntamente com o semestre letivo. O estágio, por mais que se aproxime de uma alternativa de pesquisa, ainda compõe a categoria de ensino. Por fim, devemos reconhecer que o processo de formação não se resume à aquisição do conhecimento de maneira passiva, até porque a carência de reflexões e práticas científicas pode conduzir tanto à mediocridade teórica quanto ao tecnicismo. E “sendo a ciência também um fenômeno histórico, é propriamente, um processo” (DEMO, 1988, p.29) e neste sentido a teoria distanciada da realidade compõe um saber inconsistente. 

Não nos cabe agora apontar explicações preconcebidas, tais como falta de apoio financeiro, falta de interessados ou outras justificativas, até por que não é fator importante neste momento. "Precisamos perder o medo de ser científicos. [...] Medo de perdermos o glamour o mistério, de nos afastarmos daquela representação mítica de feiticeiros, pajés xamãs todo poderosos" (QUAYLE, 2007) . É fato, que não podemos nos esquecer que os auxílios disponibilizados deveriam ser mais adequados à realidade acadêmica para que um número maior de alunos, e até mesmo de orientadores, pudessem se dedicar à atividade. Contudo não podemos nos esquecer das oportunidades já existentes. Hoje, nossa instituição conta com três editais anuais de fomento à pesquisa, seminários em diversos cursos, seminário específico de pesquisa e extensão anual. Neste sentido, nos resta refletir sobre o modo como estamos nos apropriando deste espaço de interlocução acadêmica e qual o nosso posicionamento nesta interlocução enquanto discentes, como também, enquanto docentes. 

O que pretendemos esclarecer, principalmente aos discentes, é que o processo de socialização científica também passa pela atividade de pesquisa, onde partimos do pressuposto de que “construir ciência é em parte o cultivo de uma atitude típica diante da realidade, da atitude de dúvida, de crítica, de indagação, rodeada de cuidados para não sermos ingênuos, crédulos, apressados.” (DEMO, 1988). É com este espírito crítico que nos cabe questionar as causas da carência de pesquisa em Psicologia em nossa instituição, reconhecendo que é uma perda considerável tanto para o corpo docente quanto aos discentes. 

[1] Consulta realizada no site da instituição. 

REFERÊNCIAS

CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO. Diretório dos grupos de pesquisa no Brasil. Disponível em: < http://www.cnpq.br/gpesq/apresentacao.htm/>. Acesso em: 15 jul. 2011. 

DEMO, P.. A educação do futuro e o futuro da educação. São Paulo: Autores Associados, 2005. 

DEMO, P.. Complexidade e Aprendizagem: a dinâmica não linear do conhecimento. São Paulo: Atlas, 2002. 

DEMO, P.. Educar pela pesquisa. São Paulo: Autores Associados, 1996. 120 p. 

DEMO, P.. Metodologia científica em ciências sociais. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1988. 

FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE DIVINÓPOLIS. Grupos de Pesquisa. Disponível em: . Acesso em: 30 ago. 2011 

GÜNTHER, H. (2004). Como elaborar um relato de pesquisa (Série: Planejamento de Pesquisa nas Ciências Sociais, Nº 02). Brasília, DF: UnB, Laboratório de Psicologia Ambiental. Disponível em: . Acesso em: 28 mar. 2011.

MINAYO, M.C.S. (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 6 ed. Petrópolis : Vozes, 1996. 

QUAYLE, J.. A formação do psicólogo em psicoterapia: desafios. Disponível em: . Acesso em: 26 ago. 2011.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

O Conceito de Atenção em Psicologia Cognitiva - Parte I

Este texto visa ampliar a compreensão do conceito de atenção e dos termos centrais para o seu entendimento. Também pretende informar sobre alguns aspectos de sua constituição dentro da Psicologia Cognitiva. Ainda que não se trate de um material científico, propriamente dito, tem em vista trabalhar através de uma linguagem clara e objetiva. O trabalho será divido em partes, pois a revisão bibliográfica possuí um risco muito alto, e para evitar erros trabalharemos com calma. Para a elaboração deste material, utilizamos duas referências, primeiramente o livro “Psicologia Cognitiva” de Margaret W. Matlin e também o manual de mesmo título do autor Robert J. Sternberg. 

Quando falamos em atenção rotineiramente utilizamos o termo em múltiplos contextos e como referência a diversos tipos de processos cognitivos. Antes de tudo é necessário pensar tal ação como uma atividade básica para outros processos, tais como a consciência. E que compõe uma capacidade cognitiva de concentrar as nossas atividades mentais eliminando estímulos que interferem na atividade que está em foco. 

Logo, quatro conceitos se tornam necessários para uma melhor compreensão do tema. Compreende-se por “bottom-up” a ação de captar estímulos pelas vias de percepção através do contato com o mundo exterior à mente. Em contraponto trabalha-se a noção de “top-down” para compreender a carga conceitual e mental que está envolvida no reconhecimento do objeto. Ambos participam do processo atentivo, posicionando, à sua maneira, elementos no campo focal ou periférico. 
Em um segundo momento, é necessário compreender a noção de “processamento paralelo” e “processamento serial”. Pois se sabe que as Ciências Cognitivas se desenvolveram, em parte, segundo a metáfora computacional e neste campo multidisciplinar uma série de conceitos foram utilizados na constituição do que temos hoje como Psicologia Cognitiva. Desta forma, o “processamento paralelo” é descrito como a capacidade mental de manipular diversas informações simultaneamente. Pelo contrário, o “processamento serial”, compreende que podemos manipular um item por vez. 


As primeiras teorias sobre a atenção centravam-se na idéia sobre a qual as pessoas possuíam uma capacidade limitada de processamento. Neste momento, lançaram mão sobre a metáfora do gargalo, pois um gargalo atua como um controlador de fluxo que regula a entrada e saída de informações de maneira similar. Desde 1958, quando Donald Broadbent propôs uma das primeiras teorias baseadas na metáfora supracitada, diversas teorias foram propostas por estudiosos da área. Posteriormente, Anne Treisman (1964) apresenta um novo modelo onde, ao invés de um filtro seletivo, existiria um controle de atenuação e conseqüentemente uma capacidade limitada no que se refere ao acesso de informação sensorial aos processos perceptivos superiores. 

A teoria inicial de Broadbent sofreu fortes críticas, e em 1959, Neville Moray, através de seus experimentos sobre a escuta dicótica e o efeito coquetel, discutiu a proposta de Broadbent questionando a localização do filtro seletivo e apontando para o fato onde este filtro não trabalhava em tempo integral pelo fato de existirem informações que rompem o mecanismo de filtragem. Isto foi percebido nos experimentos citados, onde informações lançadas no ouvido dessintonizados, que mesmo em meio a uma tempestade de estímulos, ainda eram captadas pela atenção (p.ex. nome da pessoa, gênero, mensagens bilíngües, etc.). Este turbilhão de idéias, além de contribuir para o avanço das teorias, produziu novos conceitos como o de atenção seletiva por Treisman.

Este é o início das discussões sobre atenção em Psicologia Cognitiva. Espero que tenham gostado e que voltem para acompanhar o desfecho desta história. Como encerramos com a Atenção Seletiva, deixo a dica de vídeo, para pensarmos juntos sobre este conceito que estará presente nas próximas exposições. 

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Humano, demasiado, humano

Realmente: somos seres monótonos! Fazer com que um robô imite alguns padrões comportamentais humanos demandou anos do MIT. O projeto foi encerrado em 2003 com êxitos significativos para as investigações científicas e filosóficas, mas nada que se comparasse à complexidade cognitiva humana.

Só temos um único assunto para tudo e todos os momentos. Talvez seja por isso que investimos milhões, em tempo e dinheiro, para conseguir que um robô reproduza meia dúzia de palavras.

A Filosofia da Mente está nos gregos, se reformulou na Filosofia Moderna com Descartes, Kant, entre outros, e todas as reflexões servem apenas para concluir: somos monótonos e só temos um ou três assuntos no máximo.

Se isto é monotonia, eu só posso concluir que não sei o que é criatividade. Pois pensar é difícil e os insatisfeitos ainda dizem que representar conceitos, elaborar juízos, relacioná-los em um raciocínio mais complexo é o maior retrato da monotonia humana. 

Sofro por ser o que sou, mas penso que de outras formas seria pior, e que "deve ser difícil... tomar a autoridade como a verdade, em vez da verdade como autoridade." (G. Massey, egiptólogo).

terça-feira, 9 de agosto de 2011

O amanhecer de um novo dia

Um dia ele não quis mais lutar. Simplesmente desistiu! Não queria ver a vida com os mesmos olhos, e sabia que de alguma maneira, tudo merecia ser questionado. Se lançou no mundo como quem se joga no mar. Foi de braços abertos e olhos ligeiramente fechados, e foi assim que mergulhou, para sentir tudo aquilo que havia procurado por anos.
A dor da queda. A angústia do afogamento. O alívio ao respirar após ter passado alguns segundos debaixo d'água. Nunca mais viu o mundo da mesma maneira, e a vida se dotava de um sentido que há muito não experimentava. Sentir cada parte de seu corpo respirando, vivendo em meio de uma confusão que era só sua. Um sopro de vida que fora renovado em seu interior. Para alguns era loucura. Para outros, nem tanto. Mas para ele, o que era morte, se mostrou como vida. E esta era a vida que ele havia procurado por um bom tempo.